O Haiti tem enfrentado uma série de desafios ao longo dos séculos, e a situação atual é um reflexo de uma longa história de adversidades. A nação caribenha está imersa em uma crise de segurança sem precedentes, com gangues dominando a capital, desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse em 2021, e a renúncia de Ariel Henry, seu substituto, que não resistiu no poder devido ao aumento na violência, sendo decretado 2 meses de estado de emergência até o novo presidente (Edgard Leblanc Fils ) e primeiro ministro (Fritz Bélizaire ) serem eleitos; e com tudo isso força milhares a abandonarem suas casas. A infraestrutura do país está devastada, e a ajuda humanitária é insuficiente para atender às necessidades crescentes da população.
A história do Haiti é marcada por eventos que moldaram o estado atual do país. Desde a revolução dos escravos no final do século XVIII, que resultou em uma dívida imposta pelo colonizador francês, até o terremoto devastador de 2010, que deixou a capital em ruínas e causou a morte de centenas de milhares ( estima-se que foi entre 100 e 300 mil pessoas). Mais recentemente, a tomada de poder pelas gangues durante a ausência do primeiro-ministro Ariel Henry exacerbou a crise, levando à formação de um conselho de transição na esperança de estabilizar o país e preparar o terreno para futuras eleições.
Em uma entrevista conduzida por Ravi Agrawal do foreignpolicy.com, especialistas discutem a gravidade da situação. Jacqueline Charles, jornalista com mais de uma década de experiência cobrindo o Haiti, descreve um cenário de pânico e incerteza, onde a violência se tornou uma constante e o acesso a serviços básicos como saúde é severamente limitado. Jake Johnston, pesquisador sênior, destaca a singularidade da crise atual e a falta de comunicação e ação por parte das autoridades e da comunidade internacional.
A ONU tem lutado para mobilizar recursos suficientes para o Haiti, com um apelo de 674 milhões de dólares recebendo apenas uma fração do necessário. Isso ilustra a relutância do mundo em abrir seus cofres, mesmo diante de uma crise humanitária. A sociedade civil haitiana, embora sob pressão, tem sido um farol de vigilância, mas enfrenta desafios significativos devido à falta de instituições fortes e ameaças à segurança de seus membros.
A transição política no Haiti é complicada pela diversidade de atores e interesses em jogo, e o conselho de transição enfrenta críticas por assumir poderes que normalmente pertenceriam a um presidente ou parlamento. A sociedade civil, apesar de ativa, foi relegada a um papel de observador, levantando questões sobre quem realmente detém o poder e a direção que o país está tomando.
A situação no Haiti é um lembrete da necessidade de uma democracia soberana e instituições fortes para que o país possa superar suas crises e construir um futuro mais estável e próspero. A comunidade internacional deve reconhecer a importância de empoderar a sociedade civil haitiana e apoiar esforços genuínos para a reconstrução do país.
A situação no Haiti é complexa e multifacetada, com raízes históricas profundas e uma série de intervenções externas que moldaram o curso do país. A anulação dos resultados das eleições de 2010-2011 após o terramoto foi um ponto de inflexão significativo, alterando a trajetória do Haiti em termos de democracia e governança. A assistência externa, embora substancial, muitas vezes contornou as instituições locais, enfraquecendo a organização popular e a soberania do Estado haitiano.
A erosão da fé na democracia e a incapacidade dos haitianos de determinar seu próprio futuro têm sido acompanhadas por um aumento da violência paramilitar e da instabilidade política. Esses problemas são exacerbados pelo papel dos atores internacionais, cujas políticas frequentemente contribuíram para a desestabilização do Haiti.
O diálogo é apontado como o ponto de partida essencial para qualquer solução duradoura. Um diálogo genuíno e inclusivo em todo o país é necessário para abordar as divisões entre o urbano e o rural, e entre diferentes regiões e comunidades. A resistência a incluir grupos armados nas discussões é compreensível, mas a realidade é que a força por si só não resolverá os problemas subjacentes de um contrato social quebrado e um Estado que falhou com grandes partes de sua população.
A segurança é uma preocupação imediata para os cidadãos haitianos, que anseiam por estabilidade e a capacidade de viver suas vidas sem medo constante. A construção de instituições fortes e o apoio a elas são fundamentais para o progresso, permitindo que trabalhem nas comunidades para encontrar maneiras de avançar, apesar das diferenças.
A intervenção internacional, se necessária, deve ser cuidadosamente considerada e legitimada, com o objetivo de restaurar a segurança e apoiar o fortalecimento institucional. O caminho a seguir para o Haiti requer um compromisso com a reconstrução de um Estado que possa servir e proteger todos os seus cidadãos, respeitando a soberania e a vontade do povo haitiano. É um processo que exigirá paciência, compreensão e, acima de tudo, respeito pela autodeterminação do Haiti.
Quais são as perspectivas para a estabilidade política no Haiti?
As perspectivas para a estabilidade política no Haiti são complexas e desafiadoras, dadas as circunstâncias atuais. Vou abordar alguns pontos relevantes:
Missão Multinacional de Apoio à Segurança do Haiti (MSS):
- A criação da MSS foi aprovada pelo Conselho de Segurança da ONU em outubro de 2023. Essa missão tem como objetivo fortalecer as ações de segurança da Polícia Nacional Haitiana (PNH), o único órgão responsável pela manutenção da segurança no país.
- A MSS será liderada pelo Quênia e custeada por meio de contribuições voluntárias internacionais.
- Suas principais atribuições incluem combater ameaças à paz, estabilidade e segurança no Haiti, oferecer apoio operacional à PNH e proteger infraestruturas críticas.
Desafios Persistentes:
- O Haiti enfrenta uma grave crise política, econômica, social e de segurança desde o assassinato do então presidente Jovenel Moïse em 2021.
- Gangues armadas controlam áreas significativas do país, gerando violência, sequestros e interrupções no fornecimento de combustível.
- A população sofre com a fome aguda, e cerca de 4 milhões de pessoas enfrentam insegurança alimentar.
Necessidades para a Estabilidade a Longo Prazo:
O Haiti possui grande potencial econômico, especialmente considerando que mais da metade da população tem menos de 25 anos de idade.
Educação, criação de empregos e investimento em diversos setores são cruciais para estabilizar o país.
Soberania e Contexto Internacional:
A soberania haitiana tem sido frequentemente comprometida por intervenções estrangeiras.
A comunidade internacional deve considerar cuidadosamente as reivindicações legítimas do povo haitiano e buscar soluções construtivas que respeitem a soberania do país.
Quais são os principais desafios enfrentados pelo governo interino do Haiti?
Os principais desafios enfrentados pelo governo interino do Haiti são multifacetados e refletem a complexidade da situação atual do país. Aqui estão alguns dos desafios mais críticos:
Instabilidade e Violência:
- O governo interino foi estabelecido após meses de instabilidade e violência, com gangues controlando cerca de 80% da capital, Porto Príncipe1.
- Esses grupos armados têm paralisado o país, bloqueando acessos ao aeroporto e ao porto da capital, o que dificulta a distribuição de ajuda e o comércio.
Transição Política:
- O conselho de transição, composto por sete integrantes, incluindo políticos, diplomatas, um advogado e um empresário, além de dois observadores sem direito a voto, enfrenta o desafio de conduzir o país a um governo eleito até 6 de fevereiro de 20261.
- O primeiro trabalho do conselho é eleger um novo primeiro-ministro que, em colaboração com o conselho, designará o governo encarregado de conduzir o país para “eleições democráticas, livres e críveis”.
Insegurança Alimentar:
- Cerca de 4 milhões de pessoas sofrem com insegurança alimentar aguda no Haiti.
- A crise alimentar é exacerbada pela violência das gangues e pela instabilidade política, que dificultam os esforços de ajuda humanitária.
Desafios Econômicos:
- O Haiti enfrenta uma economia debilitada, com necessidade urgente de reformas estruturais e investimentos para revitalizar setores-chave e criar empregos.
Apoio Internacional:
- O governo interino depende do apoio internacional para reforçar a segurança e a governança.
- Os Estados Unidos já entregaram uma primeira remessa de equipamentos não letais, como coletes à prova de bala, para reforçar a polícia nacional.
Reformas Constitucionais e Institucionais:
O conselho de transição estabelece como prioridade realizar reformas constitucionais e institucionais para fortalecer a democracia e as instituições do país.
Em resumo, a crise do Haiti é um reflexo de problemas históricos e contemporâneos que se entrelaçam. A comunidade internacional, junto com os líderes haitianos, deve trabalhar para encontrar soluções sustentáveis que possam levar o país a um caminho de recuperação e prosperidade. A resiliência do povo haitiano é testada a cada dia, mas a esperança de um futuro melhor permanece viva no coração de seus cidadãos.